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Foto do escritorRaissa Ferreira

48ª Mostra | Sol de Inverno

Hiroshi Okuyama propõe que as emoções e paixões sejam transmitidas pelos movimentos sincronizados dos corpos, com uma fotografia romântica e onírica

Sol de Inverno Filme

Quando os primeiros flocos de neve caem, algo que seria um fenômeno natural, parte de uma transição de estações, revela-se um fator determinante para a vida da região que Hiroshi Okuyama retrata em seu filme. Quando a neve chega, o beisebol acaba e os ringues de gelo tornam-se a única opção esportiva ou recreativa para as crianças e adolescentes locais. Para os meninos, o hockey e para as meninas, a patinação. Takuya não é especialmente bom no esporte nem do sol, nem do gelo, mas rapidamente encontra um ponto de interesse no meio do inverno. Físicamente ferido pelo disco do hockey e incomodado pelo frio gelado, o menino tímido vê em Sakura uma projeção tão romântica quanto a própria fotografia de Sol de Inverno sugere. A luz difusa, passando pelos vidros da pista de patinação, valoriza os contornos corporais ao invés de permitir um foco nas expressões faciais, são os movimentos, portanto, que demonstram sentimentos e evocam emoções. Sakura parece uma bailarina de caixinha de joias quando Takuya a observa patinando pela primeira vez, a câmera passeia por seus movimentos, quase como se seu rosto não existisse, só houvesse corpo, patins e gelo, uma dança de delicadeza exaltada apaixonadamente pelas imagens e trilha sonora. É, na verdade, a paixão o que move a narrativa do longa. A do menino que quer aprender a patinar artisticamente para se aproximar da menina habilidosa, do treinador que vê nessa movimentação a oportunidade de realmente passar conhecimento a alguém e da patinadora, que transforma sua atração pelo professor mais velho em um amor por uma nova forma de cruzar a pista de gelo. 


A partir do contato dos três, há uma triangulação do olhar, Takuya projeta em Sakura uma paixão, que gera um interesse em Arakawa e consequentemente leva os três a novas motivações para viver. O trio se observa e se impulsiona na mesma medida, o progresso do menino só é possível quando Sakura passa a se dedicar à coreografia e a evolução do treinador enquanto profissional só existe no sucesso da dupla. Assim, quando o ciúmes da menina se mistura a um preconceito, a sincronia dos três é rompida, os levando a jornadas individuais, mas permanentemente marcadas pelo que viveram juntos. Okuyama busca então passar toda essa paixão para quem assiste, criando uma atmosfera doce de um romantismo onírico e inocente. Isso ocorre tanto pela forma como seus jovens atores interagem em cena, em total sintonia entre eles e com o técnico, tornando qualquer outro personagem apenas plano de fundo para a história do trio, espectadores que aplaudem suas conquistas, quanto pela estética que é quase um algodão-doce, uma nuvem colorida que paira entre as lentes e os personagens. No contraluz, são seus movimentos sincronizados que vemos, seus corpos pequenos deslizando no gelo enquanto Arakawa vem perfeitamente conectado os seguindo, guiando silenciosamente não pela frente, mas como o vento que os empurra. Sol de Inverno propõe que as emoções não transbordem pelos closes em rostos felizes, tristes ou apaixonados, mas por como seus personagens se expressam corporalmente e em relação à música de suas coreografias. 


É assim que pés dançando no mesmo passo revelam uma paixão que deixa de ser a atração infantil e se transforma em um amor partilhado pela mesma atividade, que o observar conquistas e guiar passos revela-se uma pulsão de vida. O trio estagnado na cidade em que as coisas só ocorrem de acordo com o clima, encontra em seu curto período juntos tudo que precisam para seguir em frente. É nessa mesma medida que a fotografia se torna mais realista, removendo seu romantismo inocente, quando a separação abrupta ocorre, trazendo até tons mais acinzentados. Sol de Inverno conversa com o primeiro amor de infância, a adoração fadada ao fracasso, a projeção que nunca pode ser concretizada, o coração partido que nunca esquecemos mas que pode ser determinante para nossos destinos. Takuya aprendeu a se expressar com o corpo, Sakura se apaixonou pela dança e Arakawa encontrou seu destino com professor e é nessa doçura que Okuyama leva o calor para o gelo, derretendo corações solitários e retratando os processos breves mas inesquecíveis. 


 

Nota da crítica:

3/5


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