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Crítica - Duna: Parte Dois (2024)

Denis Villeneuve melhora as limitações visuais e temáticas do primeiro Duna mostrando uma evolução e se utilizando do melhor dos seus colaboradores, mas ainda demonstra superficialidades e vícios que impedem que o seu filme chegue ao nível que ele quer


Crítica Duna Parte Dois

A jornada de Paul Atreides (Timothée Chalamet) continua com ele se juntando a Chani (Zendaya) e aos Fremen enquanto consolida a sua ascensão como líder e profeta. Novos personagens aparecem no seu caminho, a trama ganha novos contornos e acho que o cineasta Denis Villeneuve, diretor e co–roteirista do filme, demonstra que é muito melhor em "o que" mostrar do que "como" mostrar. Explico: Duna: Parte Dois já começa superior ao primeiro filme (e isso vai se seguir no filme todo) na sequência do deserto de areia colorida fervente, inserções de imagem de Paul conversando com a sua irmã que ainda não nasceu com ela dentro da barriga de sua mãe, dando uma força imagética muito maior que a mesmice do filme de 2021 pela fotografia do ótimo Greig Fraser apostar em texturas, cores e uma tentativa de poesia imagética que investiga os diferentes espaços daquele planeta ao invés da estética morta e sem graça do primeiro filme. Existem composições deslumbrantes aqui dentro dessa imaginação que combina diferentes abordagens estéticas e sonoras que vão usando do sol, da escuridão, das sombras, tonalidades de cor, inserções de branco e preto, a areia ultra amarelada ou de outras cores, cenas pesadamente dessaturadas que deixam o branco com cara de mingau, e de ruídos ao seu favor como na apresentação do personagem de Austin Butler, seu encontro com Léa Seydoux ou a cena em que Paul doma a criatura do deserto. Belas cenas todas elas.


Agora parece existir um senso de deslumbramento por aquele universo ao invés de um registro travado que se aproveita apenas de uma demonstração de aspectos técnicos isolados, só que ainda assim esse senso de deslumbramento continua bem limitado e irregular. Denis Villeneuve parece lidar muito melhor com a ação em grande escopo, com as explosões, com as imagens pomposas de ruínas, caos e soluções visuais e de áudio que chamam tanto a atenção, que talvez passe despercebido o fato que é bem notável pra mim de como ele se esconde atrás da fotografia, a direção de arte bem pensada em construir um mundinho próprio, assim como o figurino, o trabalho de som, a trilha sonora excelente, apesar dela ter um uso negativo de chamar atenção pra si mesma várias vezes de um jeito truqueiro no seu excesso. Tudo isso ajuda a esconder que na realidade a encenação de Villeneuve é bastante comum sem grande fôlego ou ideias de mise-en-scène que saiam do básico de como filmar e organizar a cena. São closes intimistas, planos abertos cheio de coisas neles, e fica nisso, não existe imaginação em como mover a câmera ou usar todos os elementos imagéticos e sonoros que ele tem em prol de uma organização que saia do “parecer bonito” e faça os elementos se movimentarem e se ligarem com mais fôlego. Quase tudo é executado de maneira bem morna o que deixa que as suas imagens nunca saiam de uma superficialidade – bela de fato, porém superficial – de um simples registro do "One Perfect Shot" justamente porque isso poucas vezes isso está a serviço da encenação ao seu redor.


O diretor acerta em conseguir dar mais peso para as questões políticas e religiosas desse filme, esse é um peso que realmente é sentido. A transformação de Paul em um profeta, sua ambiguidade entre um salvador e um tirano bem próximo daqueles que ele odeia e quer se vingar, o poder da religião, fanatismo, disputas de fé e os conflitos aqui e ali que atingem a perversidade dos vilões do filme afastados em seus mundinhos de intrigas políticas acabam sendo bem interessantes. Todos os atores fazem bem suas partes, Javier Bardem (fazia tempo que não via ele bem num filme), Austin Butler, Josh Brolin e Dave Bautista particularmente convencem muito e são bem caracterizados dentro de suas particularidades, mas sempre parece que para a lente de Villeneuve eles são só acessórios de cena, acessórios de discussões, acessórios de impactos de imagem e não personagens, o que dificulta qualquer ligação mais profunda com eles ou um destaque de fato. As interações dos seus personagens parecem artificiais e burocráticos, fazendo que o casal protagonista interpretado por Timothée Chalamet e Zendaya seja meio indiferente pra mim. A sisudez do seu cinema soa um pouco forçada, a examinação dos personagens e dos mundos é distante, o que torna que qualquer coisa tirando a pompa do filme seja pouco interessante. Porque ele é isso: pompa. Bonita, mas limitada por essa mentalidade que o cinema ter que ser só um portfólio de cenas bonitas e um tom solene.


É interessante como Villeneuve disse recentemente ser um cineasta muito mais interessado nas imagens e no som do que no diálogo e no texto, mas enche os seus filmes de diálogos entre os seus personagens explicando quem são, o que fazem e as suas relações enquanto todos são acompanhados dessa essa pompa tecnicista e ele não consegue deixar de se preocupar em tratar a dramaturgia dos seus filmes como um espetáculo também, o que acaba mostrando o quão ele é precário ao lidar com ela, fazendo que momentos como as reviravoltas e as revelações de parentescos na trama soem jogadas e subdesenvolvidos. Assim como a crise no relacionamento de Paul e Chani no final parece muito mais apática do que ele gostaria. Aprecio a megalomania e o uso do escopo gigante, mas é em coisas como os combates mão a mão travados e feitos de qualquer jeito que se percebe as limitações de Villeneuve como um esteta e encenador que nunca se sobressai como poderia pela obviedade de como registra uma beleza visual que soa acadêmica, no mal sentido da palavra, fazendo com que não exista um envolvimento profundo nela ficando preso em contar as histórias daquele personagem e daquele mundo do jeito mais afastado possível, o que deixa tudo bem morno. É um peso numa dramaturgia desajeitada.


E ele é até meio covarde, assim como o seu Sicario, se recusando a mostrar qualquer momento de violência grave ou sexual cortando na hora de qualquer ato desses mostrando isso só de maneira textual (o que contradiz a própria obsessão de Villeneuve pela imagem já que ele só consegue ficar na superfície dela e usar um texto mecânico como auxílio). Em tempos de blockbusters genéricos e padronizados é bom ver um filme dessa escala e desse dinheiro com ambições profundas, inventividades técnicas, com a visão de um autor e um desejo de capricho e preocupação visual, uma pena que o Villeneuve seja muito limitado em dar conta de tudo isso, mas pelo menos é melhor que o padrão que vemos de blockbuster, mesmo não alcançando o "paraíso" dele. Aprecio o filme mas é uma apreciação que nunca sai da distância e entra de fato no envolvimento com ele.


Filme assistido a convite da Warner Bros. Pictures e CDN Comunicação

Duna: Parte Dois chega aos cinemas brasileiros em 29 de Fevereiro de 2024


 

Nota da crítica:

3.5/5


Crítica escrita por Diego Quaglia



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