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Tribeca 2025 | Honeyjoon

Lilian T. Mehrel puxa a comédia pelos pequenos desconfortos e trabalha o luto de suas personagens paralelamente aos contextos de suas origens


Honeyjoon

Um destino paradisíaco e romântico parece o lugar perfeito para viver um luto, não é mesmo? É com essa contradição cômica que Lilian T. Mehrel leva suas personagens aos Açores, um arquipélago de Portugal com pacote especial para casais em lua de mel. A dupla de mãe e filha vai até o local para processar a morte do patriarca, que ocorreu há um ano, e é recebida por uma bela paisagem e um clima gritante de paixão e desejo dos outros turistas no hotel. June (Ayden Mayeri) faz a jornada sem encarar de frente o luto, desviando de assuntos e momentos tristes e evitando qualquer profundidade com seus sentimentos, ela opta por usar a viagem como um momento para curtir e flertar com qualquer homem bonito que cruza seu caminho. Já Lela (Amira Casar) vai até Portugal em busca de se conectar verdadeiramente com a dor, chorar e vivenciar tudo que sua perda tem lhe trazido, aproveitando a oportunidade de partilhar isso com a filha que pouco vê.


A diretora usa muito de seu contexto familiar para elaborar as personagens. Lela é uma mulher que deixou o Irã ainda criança e tem um laço muito forte com sua cultura, constantemente acompanhando os tristes desdobramentos do país e do movimento Woman, Life, Freedom. Enquanto isso, June só sabe falar inglês, criada na Inglaterra, e assim como evita o luto, foge das pautas políticas. 


É sempre interessante como a grande maioria das pessoas que fazem cinema e são do Irã ou tem alguma origem lá, mesmo quando não fazem obras totalmente políticas, as atravessam de alguma forma com uma digestão do que vem acontecendo após a revolução islâmica. Mehrel faz comédia e romance, mas não se esquece que enquanto as mulheres em seu filme podem dançar e vestir o que quiserem, existem outras oprimidas, presas e assassinadas. O corpo de June é usado em Honeyjoon como esse enfrentamento, assim como os pensamentos e a nostalgia de Lela. Ao mesmo tempo, cineastas israelenses exibem filmes em festivais e fingem que nada ocorre, uma clara representação de como é fácil para alguns virarem a cara para os genocídios cometidos por seus “estados”.


Mas, voltando ao longa. Com muita simplicidade e muito apoiada na beleza de filmar nas paisagens dos Açores, Mehrel desenvolve suas personagens a partir de suas motivações nessa viagem. Se June queria flertar e encontrar um belo homem para esquecer seus problemas, a atmosfera ao seu redor é de tesão e sexualidade, e é exatamente por esses meios que ela encontra uma forma de lidar com seus sentimentos verdadeiramente. Lela, por outro lado, está em busca da dor, de mergulhar em seu luto e, com isso, ignora seu próprio corpo e os prazeres da vida. Por meio desse sofrimento e pelo enfrentamento ao podar a filha, a mulher encontra outra maneira de lidar com suas feridas, pelo prazer.


Os caminhos de June e Lela não são necessariamente colados, embora estejam juntas, cada uma atravessa a perda de sua maneira e em seu tempo. A figura do pai falecido é sempre presente, como motivadora desse encontro e de toda essa viagem emocional, mas são as mulheres que mais importam em Honeyjoon, claramente ligando suas liberdades e sentimentos ao paralelo doloroso com o que ocorre no Irã. É assim que Mehrel é capaz de realizar um filme que é o que ela quer que seja, engraçado, sensual, melancólico, mas também aliado a uma visão política que nunca consegue ignorar o contexto de suas personagens e suas origens.




Nota da crítica:

3.5/5


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