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Tribeca 2025 | Un futuro brillante (A Bright Future)

Lucía Garibaldi explora a cobiça pela juventude a partir da ficção científica, conflitando as expectativas do mundo com uma rebelde de mente fértil

A Bright Future review

Em algum lugar da América Latina, o mundo imaginado por Lucía Garibaldi não está no futuro, nem no passado, nem no presente. É uma realidade em que produtos de consumo são escassos, os animais são raros e nem existem mais em algumas regiões, a não ser pelas temidas formigas, e os humanos sentem falta de seus barulhos, lotando ruas e casas com caixas de som que reproduzem latidos, miados e o canto dos pássaros ao longo do dia. Os jovens são poucos e as vizinhanças são bem divididas, o sul é quase proibido, com uma fronteira marcada por grades e guardas, e no norte fica a terra prometida em que apenas adolescentes selecionados com alto QI e mentes peculiares são enviados para trabalhar em um futuro melhor. 


Elisa (Martina Passeggi) é essa jovem especial que o estado busca. Depois de sua irmã ter sido selecionada e praticamente não mandar notícias para casa, nem nunca mais voltar para visitar, a protagonista de apenas 18 anos é testada e escolhida. A atmosfera que Un futuro brillante (A Bright Future) propõe é algo entre o futuro, a partir da ficção científica e da distopia pós-apocalíptica, com elementos visuais que remetem ao passado, objetos e figurinos principalmente. A fotografia expande a noção de estranheza do sistema e de como Elisa é sempre curiosa e questionadora, entre cores lavadas e pontos de atenção mais vibrantes. Enquanto sua mãe trabalha duro para juntar o dinheiro que precisa para garantir uma passagem para o norte em um leilão, sempre demonstrando sua forte crença nessa promessa, a filha mais nova não tem a mesma certeza de que aquele lugar é o melhor caminho.


Mesmo quando Elisa passa a se rebelar contra o processo de preparo para a viagem, os responsáveis insistem em sua partida, fascinados por sua peculiaridade. O futuro brilhante da jovem é uma pressão depositada nela, em que toda a vizinhança, a mãe e o sistema em geral, espera grandes coisas dela. Assim, a chegada de uma nova vizinha chama sua atenção, uma mulher livre, que não reprime sua sexualidade, com uma perna protética e que rapidamente causa asco nos moradores mais velhos do local. Leonor demonstra para Elisa uma possibilidade nova, enquanto só fora oferecido um caminho possível para a jovem em que todos depositam suas fichas.


No universo de A Bright Future, são poucos os adolescentes, Elisa é a única no bairro e só conhece outros quando começa o treinamento para a viagem ao norte. Há um desejo geral pela juventude, uma ânsia coletiva da sociedade envelhecida por essa fase da vida tão fresca e cheia de novidades. Assim, vizinhos que entram na casa da protagonista constantemente apontam como o odor ali é agradável. Pensa-se a princípio que a mãe de Elisa deve manter a limpeza sempre em dia, mas é o cheiro da juventude da garota que os mais velhos cobiçam. Nessa realidade, assim como do outro lado da tela e em qualquer tempo, ser novo é ser um objeto de desejo.


Garibaldi explora esse sentimento entre o interesse sexual e uma ânsia pessoal, quase sempre se balançando entre os dois cenários. A garota, por exemplo, demonstra desejo por Leonor, por representar o que cobiça. Elisa passa a vender seus odores para pessoas mais velhas, buscando ajudar a mãe a comprar sua passagem para o norte, e essas interações revelam tanto uma vontade de possuir o corpo, quanto de estar em sua pele. Se o mundo de A Bright Future está quase acabado, com dedetizações semanais, ausência de animais e de pessoas mais novas, ser um jovem ali é ter a chance de fazer tudo diferente, construir o futuro (de todos e o próprio), enquanto resta aos adultos e idosos o trabalho dia após dia e se conformar com a situação estagnada até suas mortes. 


A Bright Future trabalha, então, em uma estrutura bastante simples e a partir da ficção científica e do estranhamento, a noção de que toda sociedade cobiça a juventude, de que todo ser humano deseja a possibilidade de futuro de uma pessoa jovem. À Elisa, essa pressão toda não parece uma boa opção, uma promessa ou sorte, mas uma prisão. Ter sua jornada já determinada com tantos esperando que suas ações estejam de acordo com essas expectativas é rapidamente algo que ela recusa. Essa metáfora, que é determinada pelo filme pelo espaço geográfico do norte, é o amadurecimento pós-adolescência, por isso a terra prometida nunca é vista, apenas o navio saindo do porto em sua direção, e por isso a etapa de seleção é aos 18 anos, momento em que uma nova fase começa na vida de toda pessoa. 


A mente tão cobiçada de Elisa, por pensar fora do óbvio, ser sempre curiosa e pouco julgadora, é o oposto do comumente aceito pela sociedade do outro lado da tela como uma juventude promissora, mas não deixa de ser um padrão estabelecido. Os rebeldes são aqueles que escapam dessas determinações, que vão na contramão das expectativas de futuros brilhantes que os adultos ao redor projetam. Aqui, na realidade, são muitas vezes os artistas, no mundo criado por Garibaldi, é a mulher que abre mão de partes de seu corpo e viaja além da fronteira proibida, rumo ao desconhecido e ao incerto, ao invés de abraçar o rótulo que lhe foi imposto e atender às expectativas do mundo. 




Nota da crítica:

3.5/5


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