CPH:DOX 2025 | Copan
- Raissa Ferreira
- 26 de mar.
- 3 min de leitura
Com abordagem distante que preza pela fotografia, Carine Wallauer entrelaça o interior do edifício mais marcante de São Paulo com o clima político externo
Realizar um filme sobre o Copan já é uma missão que nasce com um grande peso, falar sobre um elemento permanente na paisagem de São Paulo desde 1966, e uma das figuras mais emblemáticas dessa grande e importante cidade no Brasil. Carine Wallauer abre seu longa contando sua própria relação com o edifício, de forma textual, preenchendo as cenas estáticas com sua história no Copan. No entanto, a intenção da cineasta está longe de ser íntima, seja dela mesma ou de outros moradores. Wallauer observa seu objeto de mais de 30 andares como um alienígena que ali chega, permanecendo imóvel na maior parte do tempo, silenciosa e passiva, apenas escutando as vozes que passam. O momento em que a obra é realizada mistura-se à proposta, o segundo turno das eleições presidenciais brasileiras, uma das mais importantes dos últimos anos.
Um dos caminhos de Copan, é usar essa câmera estática, centralizada, com cenas que se alteram quase que emulando um sistema de monitoramento de segurança. O distanciamento é tão parte da proposta, quanto lembrete do cenário pandêmico, que já chegava a um alívio em 2022. Esse olhar fixo não se aproxima dos moradores ou trabalhadores do prédio, mas escuta um pouco de algumas de suas conversas, capta seus modos de vida muito brevemente, a decoração de suas casas que pode ser um pouco mais absorvida pela permanência calma da câmera e que, em alguns momentos, faz parecer que as pessoas são praticamente fantasmas, de conversas escutadas como sussurros em corredores e através de portas fechadas. O longa é diametralmente oposto ao Edifício Master de Coutinho, não busca profundamente os humanos que existem nesse microcosmos, interessa-se mais pelo concreto e a agitação do momento presente.
Outra abordagem, a que entrelaça as assembleias de condomínio e a eleição de síndico com a eleição presidencial brasileira, é construída em conversas dos funcionários do Copan e mais trabalhada nas reuniões por vídeo. Quando Wallauer dedica-se mais a este assunto, sua dinâmica de fotografia muda, dando espaço à tecnologia tão usada durante a pandemia, o que também permite que as relações entre os moradores sejam mais exploradas. Por exemplo, em dado momento o síndico recebe um telefonema sobre uma cusparada entre vizinhos, mas isso fica apenas ali, no ouvir um relato breve, já na reunião online, os conflitos são observados em tela enquanto ocorrem. O homem, na gestão do edifício há muitos anos, é o único candidato e, ao mesmo tempo, muito criticado por suas posturas, principalmente machistas. Sem um adversário à altura, e com algumas dúvidas sobre o processo de eleição, seu cargo é renovado. Um paralelo bem claro com a situação política fora do prédio, mas que invade o Copan.
Copan é a estreia de Wallauer na direção de longas, suas experiências anteriores no cinema são na direção de fotografia, o que fica muito claro em sua condução do filme, como diretora, a cineasta encontra sua voz nas ferramentas que já domina. Ela preza por esse ideal estético, cenas de drones, movimentos que lembram videoclipes ou publicidades, e a sempre fixa e distante câmera observando recortes em silêncio, demonstrando mais sua vontade em criar belas imagens e conceitos visuais, do que contar intimamente uma história do Copan e dos humanos ali. Em algumas cenas, sua permanência no espaço flerta com um lado cósmico, brincando com trilhas sonoras e luzes e, entre todos os esforços para retratar o edifício, não há realmente em cena a relação entre uma moradora que se despede de seu lar dos últimos sete anos, o que é sabido pelo texto introdutório, tudo parece muito impessoal.
A escolha de Wallauer de realizar seu filme desta forma, aponta a uma proposta menos sobre o Copan e mais sobre como esse grande pedaço de concreto é invadido por uma questão política, quase como uma amostra do país em seus milhares de moradores, porém, sem grandes reflexões tecidas em sua posição controlada. Sua câmera fixa vê apoiadores de Bolsonaro e de Lula, funcionários discutindo votos, vizinhos que celebram e que lamentam o resultado da eleição. Tudo isso tão distante, como se esse momento já tão no fim dos protocolos mais rígidos da pandemia, ainda não tenha sido superado pelo filme e sua realizadora, que prefere não se aprofundar, mas pegar seu drone e observar o Copan se misturando ao horizonte cinza de São Paulo.
Esse texto faz parte da cobertura do CPH:DOX Copenhagen International Documentary Film Festival 2025
Nota da crítica:
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