Mark Mylod serve um filme que pode ser uma obra pretensiosa que se força para ser refinada ou um maravilhoso divertimento embrulhado para viagem
Para os amantes da arte - do cinema ou qualquer outro tipo - é possível identificar logo de cara os traços irritantes em Tyler (Nicholas Hoult), o típico fã que mergulha de cabeça naquilo que admira a ponto de se tornar pedante. Assim como ele, todos os personagens em O Menu são caricaturas, sátiras bem marcadas e exageradas de outras representações: a crítica, o autor, o público elitista, o espectador médio, o artista decadente, entre outros. Tudo isso para criticar todo um sistema elitista, de uma arte que quer ser conceitual e exclusiva, mas que o tenta fazer em uma embalagem de fast food. É mais uma daquelas discussões sobre arte que já tanto vimos no cinema, mas que pode ser apreciada (ou não) de várias formas, inclusive se não for compreendida.
A montagem acelerada do longa contribui para uma dinâmica que prende a atenção e transforma toda a experiência em algo pelo menos divertido, isso aliado ao humor e críticas sociais rasas que são facilmente identificadas e entendidas, fazem com que a obra de Mylod seja no mínimo um produto de entretenimento para qualquer tipo de cliente. O bom e velho x-burguer do cinema é, hoje em dia, um filme facilmente digerido, rápido e que faz o espectador moderno se divertir enquanto massageia seu intelecto. Ao mesmo tempo, o longa se esforça para ser sofisticado esteticamente e seus debates sobre a arte podem ser lidos de diferentes formas e lugares. Esse lanche com fritas pode até parecer simples, mas também quer entregar algo mais pretensioso como acompanhamento. Enquanto trabalha nessa lógica bem escrachada que ironiza e ri de tudo, funciona muito bem, mas em dado momento não se banca mais, tenta se levar a sério mostrando uma fraqueza e inconsistência no discurso.
Uma dualidade apontada pelo chef-autor Slowik (Ralph Fiennes) para Margot (Anya Taylor-Joy) indica dois lados, nós e eles, os que tomam e os que servem, mas que também podem ser diferentes formas de enxergar a arte, ou o menu. Para a classe elitista que inclui artistas, críticos, fãs e apreciadores mais entendidos, a gastronomia do Chef é algo exclusivo, que é melhor vivenciada por aqueles que a conseguem compreender, que está ali para ser interpretada, saboreada como uma experiência. Para Margot é tudo divertimento, um jantar grátis, ou na verdade um trabalho fácil que vem com um bom restaurante pago, para ela não importam contextos, prestígios do Chef ou suas intenções com suas criações, só importa comer, gostar e sair satisfeita. De um lado, uma classe que irá aplaudir tudo apenas pelo conceito, ou odiar tão facilmente quanto por não achar suficientemente bom e encontrar muitos defeitos. E, subestimando muito o outro lado, a parcela que fica bem com seu produto simples que mata a fome, sem muita firula.
Ainda que tente trazer pensamentos sofisticados numa embalagem fácil de usar, soa um tanto simplista e perde a força justamente quando mastiga demais uma crítica rasa que já não ri mais de si mesma, mas entrega um pensamento pronto, que espera pouco trabalho de quem o ingere. Enquanto alguns já acostumados com essa narrativa que pretende ser intelectual mas é largamente explicada podem se sentir satisfeitos com a experiência divertida, outros que destrincham mais seus pratos podem sentir as falhas na estrutura desse discurso reducionista, ou até sentirem algumas punhaladas no ego.
O fato é que independente de suas intenções e superficialidades, O Menu sustenta bem a diversão por quase toda sua duração, prende a atenção sem entediar em nenhum momento. É aquele lanche gourmet, mais caro e mais bonito, que vai bem às vezes e é gostoso, principalmente se você não o comer esperando demais.
Nota da crítica:
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