Recheado de muitas referências, o filme de Amanda Kramer questiona masculinidade, sexualidade e casamento, mas acaba sempre dizendo a mesma coisa
As muitas influências que rondam Please Baby Please não passam despercebidas. Logo nos primeiros segundos, na verdade, é fácil ver uma delas. Ao longo do filme é como se o espectador pudesse montar uma colcha de retalhos, mas é também muito forte a atmosfera surrealista que parece tirada de algumas obras de Lynch. Tudo isso acaba em uma obra esteticamente interessante, banhada por luzes vermelhas e azuis, com figurinos bem pensados para marcar e esbanjar as personalidades e cenários teatrais, mas que infelizmente acaba dando voltas em seu conteúdo, que parece sempre dizer as mesmas coisas em um looping de 95 minutos. Toda a atração que o longa cria por seu visual vai se perdendo aos poucos quando foca nos diálogos repetitivos de seus personagens. É bem claro que Kramer quer usar sua fantasia queer para questionar os papéis de gênero, mas acaba que nenhuma ideia consegue se aprofundar pelas limitações do texto, que não acompanha bem o desenvolvimento do visual. Por si só, a mudança estética de Suze (Andrea Riseborough) já poderia ser um argumento forte o suficiente para falar sobre masculinidade e o papel da mulher no casamento, por exemplo, mas tudo é enfraquecido por uma necessidade de soar artístico, poético e vanguardista.
Tudo isso lembra muito um teatro amador, feito por pessoas no auge de seus encantamentos com a carreira artística, se esforçando para criar algo que grite arte sem realmente saber como encontrar sua própria voz, sua forma de fazer essa arte. É assim que o filme de Kramer soa, num mar de muitas influências parece que a diretora se esforça para criar algo único que não seja apenas uma peça audiovisual, mas uma experiência de arte e uma referência da cultura queer. Isso não significa que seja ruim, além de ser válido e de ser bem óbvio que ela realmente tem algo importante a dizer, o problema é que parece que ela não encontra os caminhos para se mostrar como autora ou para traduzir melhor suas ideias, ficando tudo apenas num conceito. Assim, Arthur (Harry Melling) fica preso num mesmo ciclo de rejeitar uma masculinidade violenta enquanto questiona sua sexualidade. A cada nova sequência suas falas parecem quase iguais, como se nada se desenvolvesse a partir disso. Da mesma forma, Suze quer abraçar um lado mais duro e agressivo, deixar de lado uma feminilidade frágil atrelada socialmente ao seu gênero e ao seu papel de esposa e, para isso, ela fica nesse mesmo ciclo, dizendo as mesmas coisas, gritando para um vazio.
Entendemos e continuamos a entender os discursos de todos sobre suas questões. Os questionamentos são interessantes, ainda mais pelo contexto dos anos 50. Na teoria seria uma viagem surrealista de pessoas que estão desesperadas para serem elas mesmas, rompendo com os contratos sociais que as prendem. Mas, infelizmente, fica um tanto tedioso acompanhar as voltas que o filme dá nos mesmos pontos, sem avançar. É a beleza da obra que faz a narrativa andar, a cada cena em que nada ou quase nada é dito, fica mais fácil entrar naquele universo de uma noite colorida, em alguns momentos é até fascinante de observar, até que mais uma vez, as ideias pareçam perdidas, sem saber para onde ir.
No fim, Please Baby Please, tem poucos momentos divertidos, mas muitas cenas bonitas, com algumas boas ideias, mas que não são capazes de preencher um filme de mais de uma hora. Se for pelo conceito artístico, pelas referências (até a presença de Demi Moore tem esse apelo) ou simplesmente pelo tema - não importando quão bem ou mal desenvolvido ele está - é possível que agrade quem não se entediar com a falta de tração. Por aqui, fico apenas com a estética na lembrança.
Filme assistido a convite da Mubi e já disponível no streaming
Nota da crítica:
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