Noah Baumbach se arrisca mais do que nunca em um filme que preza pelo caos e se sustenta em longos diálogos que não chegam a lugar nenhum
Em um espetáculo visual dos anos 80, Noah Baumbach começa seu trem descarrilado no que se assemelha a uma série de comédia com auditório. A família disfuncional de Adam Driver e Greta Gerwig é o típico retrato das produções da década, com filhos adolescentes e crianças que são extremamente inteligentes, obrigados a se virarem muito bem e até a cuidar dos pais, já que os adultos são completamente perdidos e imaturos. Vivendo na América do Norte com o capitalismo tomando conta da sociedade e tornando tudo plástico, colorido por marcas e logos, a família enfrenta uma ameaça quimicamente tóxica dentro e fora de casa. As ideias em si são interessantíssimas, mas o longa se torna cansativo em pouco tempo pelos longos diálogos que tentam ao mesmo tempo se aprofundarem em reflexões sérias que a obra propõe e serem comicamente surrealistas, desprendidos da realidade, o que até combina com o universo que Baumbach cria não fosse pelo fato de sempre travarem em algum ponto, como quem tentar dizer muito mas não diz nada. É o total oposto de Cosmópolis (David Cronenberg, 2012) - adaptação do mesmo escritor - que consegue ambientar o caos e o levar por seus longos diálogos que juntos, dizem tudo.
O diretor divide sua obra em três capítulos, dois deles até seguem algum sentido com a narrativa, mas o terceiro parece um projeto abandonado e até o final é possível esquecer que essa divisão ocorreu em algum momento. O mesmo acontece com o tema das colisões, extremamente pontuado na introdução e que retorna algumas vezes até quase a metade do filme mas depois fica largado, sem mostrar realmente sua importância. Há essa necessidade latente de abandonar todos os sentidos e usar o caos como lógica, o que seria perfeitamente funcional, não fosse a forma como Baumbach tenta a todo momento levar a narrativa para frente, de forma linear, depois de construir um caminho que pede justamente por uma liberdade de se movimentar. Não é necessário buscar sentido no cinema, mas se a obra o busca fica difícil não se perder. Os diálogos que filosofam constantemente também pioram essa situação, pois ainda que tenham o tom cômico e surreal, também são densos e explicativos - às vezes até demais. Então tudo parece colidir, a necessidade de não fazer sentido com a busca implícita por ele, o caos com a necessidade de ordenar. Somos levados por um carro que quer chegar no seu destino mas para o tempo todo e muda de direção.
O tema do medo da morte, diretamente atrelado a um contexto histórico e político dos Estados Unidos e do próprio capitalismo, trabalhado através da mãe, Babette e eventualmente do pai, Jack, aumenta o sentimento de que os adultos são completamente incapazes de cuidarem de suas famílias, deixando o maior trabalho para os filhos, principalmente Denise (Raffey Cassidy) que é certamente a personagem mais interessante aqui. Ainda assim, é mais um ponto pouco trabalhado no meio de tantas outras questões que são levantadas e largadas no caminho. Tudo soa muito frágil, mesmo que sejam tópicos importantes, são apresentados de forma fraca. Há também uma miscelânea de gêneros, o filme catástrofe, a comédia, o drama e em dado momento uma sequência que parece extraída de Férias Frustradas (Harold Ramis, 1983). Todas essas referências dos anos 80, todos os gêneros e todos os temas ficam bagunçados e perdidos numa narrativa que se esquece o tempo todo para onde estava indo. Talvez seja um efeito colateral do Dylar, ou talvez seja só um amontoado que quis ser algo que não sabia muito bem como ser.
Entre o medo de morrer, o ar tóxico, ameaças químicas, capitalismo tardio, a espetacularização, e outros tantos temas, Ruído Branco realmente parece ter algo impressionante escondido em seu conteúdo que não conseguiu se traduzir na forma. Possivelmente isso se dá por conta da obra original, o livro de Don DeLillo, que sustenta a alma dessa adaptação, mas como lidamos aqui com o filme e não com o texto que o inspirou, talvez a visão do diretor tenha falhado em colocar todas essas ideias na tela e tornou o filme mais um produto de prateleira de streaming, para gerar debates infinitos sobre sentidos e significados por algumas semanas antes de ser inevitavelmente esquecido.
Nota da crítica:
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